Monday, September 06, 2010




REGRESSO ÀS AULAS


Em 1960 o Ministério da Educação tomou uma iniciativa que, segundo creio, não mais se repetiu: criar uma comissão para reformar o ensino das artes aplicadas em Portugal. Dessa comissão faziam parte Frederico George, Calvet de Magalhães, Luís António e Sousa Caldas a quem se deve a proposta e discussão junto do Ministério da criação do curso de design.

O documento de criação do Curso de Design ficou fechado nas gavetas dos gabinetes ou, pelo menos, a sua criação foi sucessivamente adiada fosse por divergências relativamente aos planos de estudo, fosse por divergências em relação aos protagonistas. Como é sabido, essa indefinição do público foi aproveitada pelo IADE em 1969 embora o Curso de Design e Artes Gráficas só surja em 1973.

Antes disso, num artigo publicado em 1971, Sena da Silva recordava que a desejada do ensino público contemplava a criação de uma Escola de Estética Industrial que, sob a inspiração da Escola de Ulm, deveria afirmar o design como disciplina capaz de abranger os campos da artes plásticas e da arquitectura.

Se compilarmos o que, ao longo dos anos 1960 e 1970, foi dito e escrito sobre a formação em design, as competências do design, o seu papel face ao Mercado e à sociedade, concluímos que nos últimos 30 anos a discussão efectiva sobre o ensino e o desempenho profissional do design adormeceu.

Infelizmente Bolonha ficou marcada por um processo de adaptação, mais ou menos forçada, mais ou menos confusa, e menos por um processo de discussão e orientação do ensino do design em Portugal.

Em relação à produção crítica, já há uns meses eu recordava que a partir do início da década de 1970, uma série de textos, escritos em português, vão afirmando uma certa maturidade no que à produção teórica sobre design diz respeito. Encontramos, num conjunto vasto de textos, duas preocupações recorrentes: a afirmação do "lugar do design", procurando afirmar a autonomia da disciplina relativamente a outras áreas de produção artística ou industrial; a sua definição crítica, procurando estabelecer um programa orientador da prática do design.



Um bom exemplo desta dupla preocupação encontramo-lo num texto intitulado "O Lugar do Design", publicado por Carlos Duarte no excelente catálogo (desenhado pelo Estúdio Quid de Carlos Gentilhomem) da EXPO AICA SNBA 1972. O texto de Carlos Duarte revela um claro pragmatismo associado a uma interessante visão ideológica que faz da sua reflexão, frequentemente, uma reflexão de alcance mais alargado em defesa da necessária transformação das estruturas sociais e culturais portuguesas. Duarte fala na necessidade de "tomar consciência e debater criticamente todo um processo que não é isento de dúvidas e contradições - para mais sujeito em toda a parte a opções ideológicas de sentidos vários e discordantes."



É também importante lembrar que o corpus teórico sobre design produzido em Portugal durante esse período anterior à revolução surgiu sobretudo nas páginas dos jornais e revistas. Algo que hoje se afigura impossível (depois do fim da colaboração de Frederico Duarte a excepção são os contributos ocasionais de Mário Moura no Público, tudo o resto se restringe a publicações na web e textos académicos pese embora o surgimento de novos nomes ligados à crítica como Francisco Laranjo ou Joana Sachetti), ler um artigo sobre design num jornal de referência foi possível, em inúmeras ocasiões, nos anos 1960 e 1970. Recordo, por exemplo, os textos de Maria Helena Matos, Calvet de Magalhães e Sena da Silva no Diário de Lisboa; de Lima de Freitas no Diário Popular; para além das revistas, como a Binário onde João Constantino publicou, com grande regularidade, textos de crítica de design.

Num texto publicado em 1963 no Times Literary Supplement, intitulado O que é a crítica?, Roland Barthes destingue, com clareza, a linguagem-objecto da metalinguagem. A linguagem-objecto é a própria material que é submetida à crítica; a metalinguagem é a linguagem na qual se faz essa crítica a um determinado objecto. Daqui resulta que a crítica deve sempre ser objectiva, no sentido literal do termo, relativa a um determinado objecto. Que não restem dúvidas: a crítica não “inventa” o objecto criticado; o objecto criticado não é dependente da crítica, mas aquilo sobre o qual a crítica reflecte e a reflexão crítica estão interligados. A força de um é a força do outro, a fragilidade de um é a fragilidade do outro. No início de um ano lectivo, há que renovar as ambições de melhor design.

2 comments:

Miguel Sanches said...

Boa tarde,
Tenho acompanhado com alguma assiduidade os seus textos, particularmente aqueles que dizem respeito ao ensino e à crítica de design em Portugal, talvez por ser docente do curso de Design e Artes Gráficas do Instituto Politécnico de Tomar.
Todos os anos os alunos finalistas da licenciatura do nosso curso são responsáveis pela organização de um simpósio denominado ARTEC que pretende ser um espaço de diálogo e partilha entre profissionais e estudantes, aliando a arte e a técnica das artes gráficas.
Gostaria de saber da sua disponibilidade para nos poder visitar e dar o seu ponto de vista sobre o ensino do design em Portugal aos nossos alunos e visitantes no evento de 2011, naquela que será a XXI edição. As datas prováveis são 13, 14 ou 15 de Abril.
Agradeço desde já a atenção prestada a este pedido.
Cumprimentos

REACTOR said...

Olá, agradeço o convite. nada melhor do que combinarmos por e-mail: bartolo.jose@gmail.com

um abraço

PERFIL

REACTOR é um blogue sobre cultura do design de José Bártolo (CV). Facebook. e-mail: reactor.blog@gmail.com